sábado, 25 de dezembro de 2010

Caos aéreo, você ainda vai conhecer

No início de 2008 passei duas semanas adoráveis na praia de Matadero, na porção açoriana da ilha de Florianópolis. Lembro que quando a data -- final de dezembro de 2007 -- começou a se aproximar, fui sendo tomada de um pânico incontrolável. O problema não era o avião, e sim os aeroportos. O caos aéreo que se seguiu ao acidente com o avião da TAM (pessoalmente foi um horror, pois eu estava em Porto Alegre e a cidade vivieu um severo luto) me impedia de cogitar pisar esses lugares inóspitos, nessas rodoviárias metidas a chic onde um café custa uma fortuna, não há um lugar confortável para a espera, a La Selva tem um estoque ridículo de guias e revistas -- livro bom, então, nem pensar -- enfim, estava com bode. Valentemente entrei no meu possante e lá cheguei, pra só pegar o carro de volta no dia do retorno. Ou seja, seria melhor o avião.
O problema é que há lugares onde só chegamos assim... e enfrentei meu primeiro perrengue sério há dias. Estava em Paris, sob um inverno dos bons. Paris não foi feita pra neve, no máximo um pouquinho, pra cidade brilhar ainda mais de tão branca, pra dezembro ficar com a cara do mais clichê dos natais. Só que tem nevado muito, aí a cidade luz vive dias de São Paulo com chuva. Nada funciona direito, o metrô lota, os carros param, os pedestres levam tombos. E no dia do meu retorno, Orly virou um pesadelo. O nome do aeroporto me remetia ao sambinha do Chico, mas nem isso melhorava o panorama. Os vôos começaram a atrasar, e neve era muita e fiquei quase duas horas dentro de um avião, com fome, sede etc., esperando pra ver se decolávamos. Claro que aproveitei pra aprimorar meu francês com os passageiros ao lado, mas foi um pesadelo.
Mal sabia eu que o pesadelo mal começava. Cheguei em Lisboa a tempo de pegar meu avião para São Paulo. Lotado até a última poltrona, o Airbus decolou com um barulho que me pareceu anormal. Como não temo voar, dei uma cochilada. E o serviço de bordo, nada.... quando ouvi a voz da hospedeira, como eles dizem em Portugal, e já fui abrindo minha mesinha, o aviso era de que estávamos voltando pra Lisboa. Daí pra diante, teve início um verdadeito circo de horrores: as hospedeiras recolhiam, nervosas, os cobertores (as mantinhas, diziam elas) e ninguém nos explicava qual era, afinal, o problema técnico.
Fazia muito frio no aeroporto, que já tinha fechado. Meus raros leitores devem achar que só penso em comer, mas sem serviço de bordo e sem um mísero pastel de Belém, eu sentia ainda mais frio. Queria um café, um chocolate quente. Foi difícil pra companhia conseguir ônibus e hotel pra tanta gente, e já era mais de 4 da manhã quando finalmente consegui um quarto. O hotel não estava minimamente preparado pra tamanha confusão e a rececpção não foi exatamente prestativa e educada: ao contrário, muitos passageiros, sem dinheiro, passaram por uma situação constrangedora, uma vez que o hotel estava muito preocupado com a possibilidade de um hóspede da TAP tomar o champagne caro do frigobar...ora, faça-me o favor. Em tempo, o Hotel Tiara, grosserias à parte, era até bem confortável, mas os passageiros pareciam baratas tontas, sem informações precisas, cansados, com um humor daqueles....
Finalmente fomos chamados de volta ao aeroporto. Viajamos na mesma aeronave, que foi reparada -- do que? uns falavam em conversor, o que em um Airbus é temerário -- e o vôo foi tranquilo. Cheguei sã e salva, mas não posso pensar em pisar num aeroporto.


Só que não se vai pro Caribe a bordo de um valente C3, de modo que em dois dias estarei enfrentando o ineficaz aeroporto de Guarulhos, em meio a notícias de atrasos e descasos.
Coragem, Sil, pense no Caribe!
Em tempo: o mínimo que todo aeroporto poderia oferecer de graça para seus passageiros é uma boa internet wi-fi.
Na imagem, o Jardim de Luxemburgo numa tarde de neve. Como é lindo na foto!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A caminho de Paris

A caminho de Paris. Com preguiça, pois a previsão meteorológica é de lascar. Por outro lado, o objetivo é participar de um colóquio cujo tema é "cidade e imigração". Consigo pensar em poucos temas mais pertinentes para nosso momento. Isso vale para Paris, cidade iluminada onde um governo obscurantista cogita o tempo todos cercear a liberdade de expressão de grupos imigrantes. E vale para São Paulo, onde grupos enfurecidos gritam "go home" (ou mesmo coisa pior) para grupos que vêm de outras regiões do país.
Aqui, lá ou em Nova York: o que seria das nossas cidades sem tudo que os imigrantes trouxeram? Sorry: nada, uma chatice.
Eu vou pra Paris com alegria, mas minha Paris é aquela que inclui Belleville e outros cantos e antros que fazem lembrar o tempo todos que mundialização não é uma mera propaganda de cartão de crédito, aquela irritante falsa harmonia entre os diferentes. É um desafio político dos bons, e para observar isso também se viaja.

sábado, 27 de novembro de 2010

Cidade maravilhosa, sitiada?

Fim de ano. O cansaço deixa todo mundo mais sensível. As notícias que chegam do Rio são alarmantes. A imprensa não facilita. E eu tenho um compromisso lá daqui uns dias. Se eu não for vai pegar um pouco mal, mas todos entenderão. O medo alheio merece respeito.
Acontece que não tenho medo do Rio de Janeiro. Nunca tive. Conheço  muita gente que não pisa na Cidade Maravilhosa por temor. O Rio me dá o medo que qualquer lugar cujos códigos desconheço me dá. Só vou onde falo minimamente o idioma. E aprendi a falar com o Rio, a escutar o Rio. Continuo aprendendo.
Quanto ao meu evento, até segunda ordem, lá estarei.

O maior medo que o Rio me causa é da vontade de nunca mais voltar de lá.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Outro B&B, agora em Mexico City





Na virada de agosto pra setembro passei onze deliciosos dias na Cidade do México. Fazia pouco mais de um mês que eu havia voltado da Suíça, ainda guardava em mim a boa impresão causada, pelo Dakini's (tratada com detalhes em post anterior) e desejava algo por aí para lá me abrigar. Desta vez a viagem era para participar de um congresso, cuja organização tinha disponibilizado, como de costume uma lista de hotéis recomendados. De cara eliminei El Diplomático, hotel que tinha boa localização para minhas finalidades na cidade, mas de onde eu guardava uma lembrança de anos antes, de tudo que prefiro evitar: gente demais, serviço desatento e impessoal, hordas de homens fechando negócios no café da manhã, embalados pelo aroma de huevos revueltos, e aquele café que permite que se enxergue o branco porcelana do fundo da xícara. Em outras palavras, o pior da padronização. Certamente tem quem aprecie e quem sou eu pra dizer algo? Pra piorar, uma amiga me alertou quanto à baixa qualidade de alguns hotéis baratos na cidade, contou mesmo que fez uma reserva pela internet e ao chegar foi embora correndo!
Pra complicar, a Cidade do México é enorme. Não que isso assuste uma paulistana nascida e criada, mas o congresso foi na universidade nacional, a UNAM, extremo sul. Acho que a beleza daquele campus compensa qualquer travessia, mas era bom que o hotel não fosse no extremo norte.
Fui salva por um comentário no New York Times, que tem um excelente caderno de turismo, que consulto sempre. Um leitor escreveu que depois de se hospedar no bed& breakfast El Patio 77, esse assunto estava para ele resolvido. Simples assim. Fui ao site http://www.elpatio77.com e gostei de tudo que vi. Resolvi, literalmente pagar pra ver. Caso não gostasse, mudaria para algum hotel onde meus colegas estivessem hospedados.
Fui e fiquei. Logo ao chegar, com as indicações precisas de Diego (inclusive quanto a preços de taxi, o que será tema, algum dia, para outra postagem) encontrei meus conhecidos da Suíça. Com uma delas é italiana de Roma, o lindo pátio de desayuno tornou-se um local familiar e poliglota, com espanhol, francês e italiano convivendo com português. Diego morou em Salvador e o outro proprietário, Alan, estuda português e fala razoavelmente bem.
Diego é francês, Alan mexicano. Juntos, transformaram um casarão do final do século XIX em um local mais do que charmoso, original e acolhedor. Não há na casa um detalhe que não mostre ter sido escolhido a dedo: louça, roupa de cama, as pastilhas dos banheiros, os móveis de cada quarto -- um diferente do outro -- as plantas e cadeiras do pátio interno.
El Patio 77 tem a proposta de ser um B&B sustentável. A água do banho chega beeeeeem quente, por aquecimento solar. Eles pedem para usarmos o gel de banho e xampu que fornecem, para que esta água possa ser reciclada para o vaso sanitário e, creio, para lavagem do piso e rega das plantas. Meu cabelo não ficou exatamente uma beleza, acostumado que é com os xampus da Lush, mas sobreviveu com galhardia.
O café da manhã nada tem a ver com aqueles bufês sem fim dos hotéis grandes, muitas vezes um pouco deprimentes. Diego, Alan e Berta, que trabalha com eles, trazem o café, uma mesa de casa vez, com delícias mudam a cada dia, alguns pratos com toque local, acompanhados por suco feito na hora, frutas, chá e café. O serviço de mesa é cerâmica da melhor tradição artesanal do país, e, acreditem, isso não é pouca coisa.
Mas o melhor de tudo é o grau de atenção informal e despojada que ali recebemos. Às vezes eu estava sentada pela sala checando meus e-mails (o sinal da internet wifi, gratuita, é melhor ali do que nos quartos) e sempre tinha algum deles para perguntar se eu queria água, café, chá, algo. Exatamente como fazemos quando hospedamos um amigo. O café, coado, é bom: produto orgânico de Chiapas, saboroso.
Os rapazes são bons guias da cidade, conhecem trajetos, opções de transporte. São bons guias e têm bons guias, em francês, inglês e espanhol, além de mapas. Sabem sugerir caminhos e mesmo indicar onde tomar um bom café com vista para o Zocalo.
Como nada é perfeito, a localização que o site afirma ser no centro, não chega a ser um primor. É quase... no centro, mas na linha do metrô que leva ao Zócalo e a museus como o de Belas-Artes e Arte Popular. Mas o bairro não chega a ter um charme extra, embora os dois restaurantes defronte o B&B sejam bons e baratos -- já sei, tudo no México é barato, mas estes são poupulares e bons mesmo. E estamos a três quadras do metrô, Estação San Cosme, lembrando que andar de metrô na Cidade do México é por si só uma experiência etnográfica!
Ou seja, o leitor do NYT estava coberto de razão. Assunto resolvido e quando voltar pra Cidade do México, voltarei para El Patio 77. À minha vontade de voltar para este país, que não é pouca, soma-se o desejo de me hospedar de novo ali.
Observação final: como eu vivia checando meus e-mails, Diego acompanhou um pouquinho da minha torcida pela corrida presidencial. Só pra lembrar, em agosto ainda havia um pouco de nível na campanha... eu comentava as pesquisas eleitorais, conversamos muito sobre nossos países, sobre a América Latina. Ele torceu um pouco comigo pela Dilma. Recentemente trocamos mensagens felizes com o resultado da eleição.
Sim, os rapazes são gentis, educados, têm um lindo gosto, são ambientalistas, informados e gauche. Pensando bem, a perfeição quase existe.

Nas fotos: meu quarto (antes da arrumaçào diária), um dos pátios internos, a linda porta de ferro e a fachada lateral do B&B.

domingo, 17 de outubro de 2010

Viajar com quem?

Há alguns anos em algum café da vida escutei um relato interessante e emocionante de um amigo que viajara pelo sertão nordestino, por Canudos, território inóspito e inesperado. Contou das estradas horríveis que enfrentou em um Uno Mille alugado, das pessoas com que conversou e lá pelas tantas perguntei: "Você estava sozinho?". A resposta foi maravilhosa: "Não, estava com Guimarães, Graciliano, Euclides".
Viajar tem isso: muitas vezes viajamos no texto, no cinema, na canção e a viagem propriamente dita é um re-conhecimento.
Há umas três décadas fiz uma viagem definidora para Diamantina, de carro, escutando Milton Nascimento, Lô Borges e Beto Guedes pela Serra do Cipó. Ao chegar, fui direto tirar uma foto da plaquinha onde se lia "Beco do Mota". Hoje, se voltasse (o que não seria uma má idéia), iria correndo atrás dos lugares aquarelados pelo arquiteto Lucio Costa em uma viagem também para ele definidora de muitas escolhas profissionais.
Isso tudo me vem à cabeça numa manhã de domingo enquanto arrumo uma mochila para uma viagem bate-pronto para Ouro Preto. Uma palestra e volto. Vou sozinha? Mais ou menos. Vou com Mário de Andrade, Osvald, Tarsila e Blaise Cendrars, que para lá foram nos anos 1920.
Nesses anos, Osvald escreveu: “Ide a São João Del Rei / De trem / Como os paulistas foram / A pé de ferro”.
Vou pra Ouro Preto de avião e carro, como os modernistas foram um dia para reescrever parte do seu destino, do destino da cidade e em alguma medida do meu.
Ouro Preto foi tombada em 1933. Em 1980 passou a fazer parte do chamado Patrimônio da Humanidade. Trinta anos depois, celebra esse feito. É com alegria que vou fazer parte dessa festa.

domingo, 10 de outubro de 2010

Um B&B adorável em Zurique

Adoro observar detalhes em hotéis: a linda louça branca do hotelzinho de Santiago de Compostella, ou a atenção e o cuidado com o hóspede do pequeno residencial de Coimbra. No já citado hotel-boutique Mamma Shelter os mimos de banheiro são Kiehl's, o que conta ponto, a meu ver muito mais do que a TV grandona da Apple que está fixada em frente à confortável camona. Lavar as madeixas com xampu da Kiehl's restitui o bom humor a qualquer viajante cansado de tanto bater perna numa Paris especialmente gelada como estava em janeiro último.
Outro detalhe imprescindível em qualquer hotel é internet gratuita, wi-fi e com boa velocidade. Cortesia, mesmo que seja disfarçada, embutida no preço final. O viajante tem todo direito, depois de longos translados, chegar no quarto e mandar um e-mail pros seres amados contando que chegou bem, ou de usar aquele skype básico, isso para não falar de trabalho. Poucas coisas são mais chatas do que cartãozinho, serviços terceirizados de internet e senhas que expiram: tem que ligar o note ou o net e pronto, falando com o mundo.

Curiosamente tive duas experiências recentes muito, mas muito boas e não foram em hotéis chics ou caros, mas em adoráveis bed & breakfast. Comecemos pelo Dakini's, em Zurique, cidade tão cara que dá saudade da Inglaterra e suas libras. Tudo é caro em franco suíço, inclusive a mais simples hospedagem. Uma semana a trabalho no verão, low-budget X alta estação, o que fazer? Ainda bem que descobri o Dakini's (www.dakini.ch), um b&b cheio de qualidades.
Ao chegar a dona, Suzanne Seiler estava lá para me receber e dar a minha chave. Dali pra frente seria comigo: nada de serviço de quarto ou portaria. Ela se desculpou por não falar português, mas diante do menu linguístico que inclui espanhol, holandês, inglês, italiano, francês e - claro - alemão, combinamos que inglês seria o código cotidiano. Suzanne é um guia ambulante: conhece bem a cidade, todos os ônibus e bondes, indica o caminho mais curto e também o mais bonito para qualquer lugar.
O b&b fica num bairro perto do centro, definido pelo guia The Lonely Planet como multicultural. Na prática isso significa comida de tudo que é canto, um bando de sex-shops, lojinhas com produtos colombianos e brasileiros, em uma rua onde fica uma escola pública e os moradores se mesclam aos poucos viajantes.
A casa bordô de três andares é um charme. Os quartos são simples, estilosos e limpíssimos. A internet pega "de prima˜. Há uma cozinha coletiva onde a única restrição é fazer frango frito, mas é ótima para guardar sucos e laticínios para uma boquinha fora de hora. O banheiro é compartilhado com outros dois quartos, mas como a taxa de ocupação é variável, foi só meu na maior parte do tempo. O café da manhã é imperdível, com muitos itens feitos em casa como muesli, geléias e iogurte. Muitos sucos, pães divinos, chás, leite e café espresso.Um bom modo de se começar o dia, em uma mesa coletiva com vizinhos de diversas partes do planeta.
Esta pérola fica a cinco paradas de ônibus da Zurich HB, a estação de trem da cidade, que liga o centro ao aeroporto.
A menos que minha próxima viagem para Zurique ocorra em um contexto monetário pouco usual, meu endereço já está decidido. Nas fotos, um edifício industrial do bairro, o b&b e a cozinha coletiva.

sábado, 9 de outubro de 2010

Hotel em Paris

O desafio do momento é encontrar um hotel bacana e barato em Paris para o começo de dezembro. Minha dúvida é: fico pros lados do Marais, que adoro ou escolho uma região desconhecida para explorar um pouco? Perto do lugar onde vou trabalhar ou longe, para eu poder me perder e flanar, pra ter o prazer de pegar ônibus errado, descer do metrô duas estações antes ou depois?
Minha última experiênca por lá foi no início do ano, e fiquei no Mamma Shelter (http://www.mamashelter.com/): modernoso, confortável, do lado do cemitério Père Lachaise. Foi bom porque passei um dia de cama com um febrão que ganhei tomando chuva em Lisboa. Medicada e acamada, liguei pra casa reclamando que estava em Paris num hotel charmoso e doente.... para ouvir que seria pior estar doente num lugar horrível!
Acho que vou tentar o L'Amour, outro moderninho pros lados do Pigalle.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Início

Se alguém, quando eu era uma jovem de 16 ou 18 anos, pudesse prever que em uma época da minha vida eu viajaria bastante, acho que gritaria de felicidade. Hoje ando muito por aí, quase sempre a trabalho e quase sempre sozinha. Este espaço é para pensar um pouco da experiência de viajar, tanto do ponto de vista mais subjetivo (ou mesmo existencial) como das informações práticas, de coisas que fui aprendendo na situação, no descobrimento de novos lugares.
Por enquanto é isso. Pensei nesse blog depois de um banho de aeroporto, por conta da falta de teto em Confins, BH. E depois de dormir mal num hotel mais pra ruinzinho.
Ah! Minhas viagens são geralmente low-budget. Mas geralmente são muito legais.