sábado, 27 de novembro de 2010

Cidade maravilhosa, sitiada?

Fim de ano. O cansaço deixa todo mundo mais sensível. As notícias que chegam do Rio são alarmantes. A imprensa não facilita. E eu tenho um compromisso lá daqui uns dias. Se eu não for vai pegar um pouco mal, mas todos entenderão. O medo alheio merece respeito.
Acontece que não tenho medo do Rio de Janeiro. Nunca tive. Conheço  muita gente que não pisa na Cidade Maravilhosa por temor. O Rio me dá o medo que qualquer lugar cujos códigos desconheço me dá. Só vou onde falo minimamente o idioma. E aprendi a falar com o Rio, a escutar o Rio. Continuo aprendendo.
Quanto ao meu evento, até segunda ordem, lá estarei.

O maior medo que o Rio me causa é da vontade de nunca mais voltar de lá.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Outro B&B, agora em Mexico City





Na virada de agosto pra setembro passei onze deliciosos dias na Cidade do México. Fazia pouco mais de um mês que eu havia voltado da Suíça, ainda guardava em mim a boa impresão causada, pelo Dakini's (tratada com detalhes em post anterior) e desejava algo por aí para lá me abrigar. Desta vez a viagem era para participar de um congresso, cuja organização tinha disponibilizado, como de costume uma lista de hotéis recomendados. De cara eliminei El Diplomático, hotel que tinha boa localização para minhas finalidades na cidade, mas de onde eu guardava uma lembrança de anos antes, de tudo que prefiro evitar: gente demais, serviço desatento e impessoal, hordas de homens fechando negócios no café da manhã, embalados pelo aroma de huevos revueltos, e aquele café que permite que se enxergue o branco porcelana do fundo da xícara. Em outras palavras, o pior da padronização. Certamente tem quem aprecie e quem sou eu pra dizer algo? Pra piorar, uma amiga me alertou quanto à baixa qualidade de alguns hotéis baratos na cidade, contou mesmo que fez uma reserva pela internet e ao chegar foi embora correndo!
Pra complicar, a Cidade do México é enorme. Não que isso assuste uma paulistana nascida e criada, mas o congresso foi na universidade nacional, a UNAM, extremo sul. Acho que a beleza daquele campus compensa qualquer travessia, mas era bom que o hotel não fosse no extremo norte.
Fui salva por um comentário no New York Times, que tem um excelente caderno de turismo, que consulto sempre. Um leitor escreveu que depois de se hospedar no bed& breakfast El Patio 77, esse assunto estava para ele resolvido. Simples assim. Fui ao site http://www.elpatio77.com e gostei de tudo que vi. Resolvi, literalmente pagar pra ver. Caso não gostasse, mudaria para algum hotel onde meus colegas estivessem hospedados.
Fui e fiquei. Logo ao chegar, com as indicações precisas de Diego (inclusive quanto a preços de taxi, o que será tema, algum dia, para outra postagem) encontrei meus conhecidos da Suíça. Com uma delas é italiana de Roma, o lindo pátio de desayuno tornou-se um local familiar e poliglota, com espanhol, francês e italiano convivendo com português. Diego morou em Salvador e o outro proprietário, Alan, estuda português e fala razoavelmente bem.
Diego é francês, Alan mexicano. Juntos, transformaram um casarão do final do século XIX em um local mais do que charmoso, original e acolhedor. Não há na casa um detalhe que não mostre ter sido escolhido a dedo: louça, roupa de cama, as pastilhas dos banheiros, os móveis de cada quarto -- um diferente do outro -- as plantas e cadeiras do pátio interno.
El Patio 77 tem a proposta de ser um B&B sustentável. A água do banho chega beeeeeem quente, por aquecimento solar. Eles pedem para usarmos o gel de banho e xampu que fornecem, para que esta água possa ser reciclada para o vaso sanitário e, creio, para lavagem do piso e rega das plantas. Meu cabelo não ficou exatamente uma beleza, acostumado que é com os xampus da Lush, mas sobreviveu com galhardia.
O café da manhã nada tem a ver com aqueles bufês sem fim dos hotéis grandes, muitas vezes um pouco deprimentes. Diego, Alan e Berta, que trabalha com eles, trazem o café, uma mesa de casa vez, com delícias mudam a cada dia, alguns pratos com toque local, acompanhados por suco feito na hora, frutas, chá e café. O serviço de mesa é cerâmica da melhor tradição artesanal do país, e, acreditem, isso não é pouca coisa.
Mas o melhor de tudo é o grau de atenção informal e despojada que ali recebemos. Às vezes eu estava sentada pela sala checando meus e-mails (o sinal da internet wifi, gratuita, é melhor ali do que nos quartos) e sempre tinha algum deles para perguntar se eu queria água, café, chá, algo. Exatamente como fazemos quando hospedamos um amigo. O café, coado, é bom: produto orgânico de Chiapas, saboroso.
Os rapazes são bons guias da cidade, conhecem trajetos, opções de transporte. São bons guias e têm bons guias, em francês, inglês e espanhol, além de mapas. Sabem sugerir caminhos e mesmo indicar onde tomar um bom café com vista para o Zocalo.
Como nada é perfeito, a localização que o site afirma ser no centro, não chega a ser um primor. É quase... no centro, mas na linha do metrô que leva ao Zócalo e a museus como o de Belas-Artes e Arte Popular. Mas o bairro não chega a ter um charme extra, embora os dois restaurantes defronte o B&B sejam bons e baratos -- já sei, tudo no México é barato, mas estes são poupulares e bons mesmo. E estamos a três quadras do metrô, Estação San Cosme, lembrando que andar de metrô na Cidade do México é por si só uma experiência etnográfica!
Ou seja, o leitor do NYT estava coberto de razão. Assunto resolvido e quando voltar pra Cidade do México, voltarei para El Patio 77. À minha vontade de voltar para este país, que não é pouca, soma-se o desejo de me hospedar de novo ali.
Observação final: como eu vivia checando meus e-mails, Diego acompanhou um pouquinho da minha torcida pela corrida presidencial. Só pra lembrar, em agosto ainda havia um pouco de nível na campanha... eu comentava as pesquisas eleitorais, conversamos muito sobre nossos países, sobre a América Latina. Ele torceu um pouco comigo pela Dilma. Recentemente trocamos mensagens felizes com o resultado da eleição.
Sim, os rapazes são gentis, educados, têm um lindo gosto, são ambientalistas, informados e gauche. Pensando bem, a perfeição quase existe.

Nas fotos: meu quarto (antes da arrumaçào diária), um dos pátios internos, a linda porta de ferro e a fachada lateral do B&B.