segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Um B&B bem chevere em Bogotá

Acho que aderi de vez aos Bed & Breakfast. Tive duas experiências muito boas, já relatadas em Zurique e na Cidade do México, e quando estava à caça de um bom lugar para ficar em Bogotá, encontrei na internet o Chorro de Quevedo, perto da pracinha com o mesmo nome.




http://www.hotelchorrodequevedo.com
Escrevi pedindo alguns detalhes e o Massimo, o proprietário respondeu em seguida, o que já foi um bom sinal.
Fiquei com uma suíte chamada Granadillo, um flat duplex de uns bons 90m2, com telhado de vidro. Dois quartos, uma sala com cozinha integrada, um banheiro com banho beeeem quente.
A casa é um charme, um sobrado antigo pintado de vermelho. Como o Massimo conseguiu colocar os quartos ali é quase um milagre do agenciamento do espaço, mas deu certo. Chega-se à suíte por uma escada caracol muito bonita e ali dorme-se literalmente olhando as estrelas, e acorda-se dando bom dia pro Montserrat, visível pela parte envidraçada. Não cheguei a cozinhar no hotel, mas a cozinha tem geladeira, fogão, pratos, panelas, talheres. E o quarto principal tem uma linda e enorme tv plana com DVD e só no último dia descobrimos que Massimo Gaudenzio tem uma respeitável coleção de filmes colombianos.
Há computadores à disposição dos hóspedes na sala do café da manhã, mas a internet pega bem em qualquer lugar, sem custo adicional.
O atendimento é pra lá de pessoal. Houve dias em que ao chegar encontrava flores em meu quarto -- na verdade, há flores por todo o lugar ali, com destaque pras belíssimas rosas colombianas. Mais de uma vez Massimo saiu pra comprar quitutes colombianos -- como tamales -- para que experimentássemos, assim como pedia pro seu auxiliar Alejandro trazer itens como um queijo campesino, riquíssimo, de seu pueblo para nosso desayuno. No primeiro dia, nos acompanhou para que trocássemos dólares por pesos.100% gentileza.
A localização é perfeita, pois está no coração da Candelária, perto dos museus -- Museo del oro, Museo Romero, Museo de la Independencia -- da Catedral e do lindo, charmoso, surpreendente e imenso centro histórico. Em uma cidade onde andar de taxi é uma aventura emocionante, isso não é pouco.
Bogotá foi uma caixinha de surpresas boas, e foi bom ter ficado hospedada no lugar certo.

domingo, 23 de janeiro de 2011

O mar azul de Cartagena

Quando o avião avisou que estava em procedimento de pouso eu, que estava na janela, tratei de acordar e abrir bem os olhos. Valeu a pena, pois vislumbrei uma localizade recortada, um porto em meio a um azul sem fim. Foi minha chegada em Cartagena, prometendo desde o início.
Confesso que escolhi o hotel por sua proximidade da praia (Google Maps informa, mas nem tanto) e antes de partir já tinham me avisado que a praia da cidade era uma droga. Mais do que isso: além de ruim estava com o mar ressaquento, rabioso. Tentei conhecer outras praias da costa, mas brasileiro é bicho chato nesse quesito. Cheguei a uma praia de areia cinzenta, enorme, sem graça nenhuma, dei meia volta e voltei.
Ou seja, o negócio mesmo era encarar o mar aberto e ir pras ilhas. E para tanto temos que encarar os barcos.
Movimento dos barcos... a canção do Macalé ecoou muito nesses dias.
Tudo começa com a chegada ao porto. Mal o viajante coloca os pés nas proximidades, e é atacado por um enxame de intermediários querendo vender algumas horas no paraíso.
Pisei firme e fui direto aos guichês, mas o panorama não muda muito. É preciso negociar tudo: o trajeto, o preço, os horários. Depois disso paga-se uma taxa portuária, por um porto sem qualquer informação do que fazer, para então proceder ao embarque. Só que antes disso, do lado de fora eu já tinha deixado claro que não pretendia ir a nenhum show de golfinhos (como disse no post anterior, Cartagena tem um coté Miami). Ao embarcar, advinha! O barco queria ir ao aquário com golfinhos etc. Ou seja, descobri e ouvi literalmente de um barqueiro que o que se combina do lado de fora nem sempre corresponde ao que ocorre do lado de dentro do porto.
Ok, o barqueiro é um mero trabalhador, as agências são malandras e o dia está lindo. Demora-se tanto por que? Porque é preciso que a lancha parta em sua capacidade máxima. E assim vamos, todos com coletinho salva-vidas, o pequeno barco em plena lotação, muita emoção por alguns milhares de pesos colombianos. E haja filtro solar no marzão aberto. E na volta a adrenalina é ainda maior porque a maré está nervosa, as lanchas dão aqueles pulos dignos de filme.
Imagino que metade da zorra se deva à alta temporada.
Quer reclamar? Ali pude lembrar do dito mexicano (segundo o Nestor Canclini, um equivalente ao brasileiro "você sabe com quem está falando?") que reza: "Se te enojas, pierde". Em algum momento uma turista reclamou de algo e a lancha voou pelas ondas, desafiando a gravidade, como a lembrar quem é que manda ali -- ao menos naquela circunstância e naquele momento.
Por que, com todos esses dissabores, eu estava de novo no porto no dia seguinte? Porque isso tudo liga a encantadora Cartagena ao mar mais azul que já vi. É pra parar de cantarolar Macalé e começar a homenagear Lou Reed -- What a perfect day!
Passei um dia na Isla de Piratas, super turistica, minúscula, onde se pode comer uma lagosta olhando a imensidão turquesa. E a Isla Baru, cuja Playa Blanca é, sem dúvida, uma das mais belas que já tive o privilégio de ver. A areia é branca, o mar tem todos os tons que o azul tem o direito de ter, e a temperatura é tépida, perfeita. Não conheço todos os mares que desejo, mas já peguei praia no Mediterrâneo, em diversos pontos do Atlântico, alguns do Pacífico e no mar do Sul da China. E o Caribe dá um banho, literalmente, em todos eles. E mais não escrevo só porque as palavras não dão conta da experiência.
Claro que o tempo todo tem gente oferecendo algo: massagem, cerveja, manga, camarão, melancia... ignorá-los é quase um exercício budista, mas o mar à frente ajuda.
Depois de um dia perfeito, vem de novo o perrengue dos barcos. Mas nada que um trago em alguma praça da linda Cartagena não cure. Se tivesse mais dias, voltaria.
Voltarei, quero dizer.



quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Cartagena de las Indias

Há poucas coisas das quais eu acho que entendo um pouco, e entendo de centros históricos. Já estudei alguns, já visitei vários. Em qualquer cidade, minha primeira tarefa é visitar a parte antiga, seja lá o que cada localidade assim chame: um casco viejo é sempre algo que me tira de casa para conferir. Ainda assim Cartagena me pegou no contrapé, reservou muitas e agradáveis surpresas. Fiquei hospedada na cidade murada - amuralhada como eles dizem - algo entre Parati, Salvador e Havana, mas muito mais bonita.
A cidade é um porto e é a Colombia negra, e as marcas desse passado portuário, pirata e de escravidão ecoam por diversos pontos. O arruamento é árabe, o que em poucas palavras quer dizer que há uma falsa simetria, pois quando menos se espera uma rua dá uma "quebradinha", uma "entortada" leve, de poucos graus e pronto: relações cartesianas, paralelas e perpendiculares, tudo isso vai pro brejo! O resultado é que me perdi todos os dias, o que numa cidade tão bonita é uma benção. Quando eu tomava o muro como referência, era ainda pior, pois vemos o muro de diversos pontos. Essa que vos escreve, pouco dotada pelos deuses com senso de direção, se perdia até para ir à padaria. Claro que aproveitava para um passeinho antes de me achar, e achar a Mila, a melhor panaderia da cidade, onde comia muito bem e tomava sucos batidos com polpa de côco verde, uma perdição. Melhor ainda, só uma enoteca em frente, perfeita para um espumante ao cair da tarde e uma livraria na esquina: livraria com bons livros, café colombiano bem tirado e nenhuma empostação.
Gabriel Garcia Marquez reina nesta, em todas as livrarias e na cidade, só perdendo para Simon Bolivar, onipresente nas praças, imagens e narrativas. Tentarei juntar os dois ícones em minha cabeça lendo El general en su labirinto.
O labirinto cartagenero presenteia o visitante com uma rua mais bonita do que a outra.Tem cor em tudo, não como o Pelourinho baiano que ficou muito fake à época de sua revitalização, ainda que a praga do financiamento das fábricas de tinta, essas parcerias do tipo "cores da cidade"também ronde Cartagena. Mas por enquanto as cores ali são mais orgânicas, casas descoradas ao lado de outras de tons fortíssimos, com combinações esdrúxulas e estados de conservação variados.
Varandas e mais varandas, gelosias, muxarabis, portas imensas com sinetas em forma de animais, cores e mais cores sob um sol que queima os olhos de tão claro. As coisas vão mudando de tom, ganhando luz e sombra ao longo do dia, assim como a cidade. Preguiçosa ao amanhecer, nada ali começa muito cedo, Cartagena parece que vai acordando com o passar das horas, e a impresão é que comércios, pessoas, atividades vão brotando, aumentando ainda mais o efeitos surpresa dos roteiros a esmo.
Cartagena é Caribe. Claro que eu sabia disso, assim como estava preparada para estórias de pirata, fantasmas de Francis Drake. Mas ao lá chegar caiu a ficha, não apenas pelo tom inacreditável do mar que já vi da janela do avião, mas pelo tanto que a cada esquina em me lembrava de Cuba, tanto de Havana como de Santiago, cidade de Ibrahim Ferrer que conheci muito bem há mais de uma década. Se eu passeava por aquelas ruas sem comércio cantarolando "Eu vim da Bahia", de tanto que elas me lembravam Salvador, dessa vez a sensação foi de estar numa Cuba em vias de globalização.
Penso que conheci Cartagena no momento certo, antes talvez tivesse sido ainda melhor. Uma noite uma conhecida me mostrou o predinho republicano onde viveu por anos, onde nasceu sua filha caçula e que lá pelas tantas foi comprado pela rede Sofitel. Inquilina, ela teve que deixar o apartamento e por conta dos preços infacionados ela, como tantos outros, não pôde mais morar intramuros. Parece que esse sutil processo de gentrification -- sim, é sutil -- está se espraiando e notei no Getsehmani, o bairro dos trabalhadores e seus ofícios, uma certa tensão nomeada nos muros, ao lado de uma interessante arte urbana.
Vamos ver o que acontecerá nos próximos anos, pois se Cartagena nada tem do coté parque temático que identifico com triteza em alguns centros históricos, a Colombia está jogando todas suas fichas no turismo. O que posso dizer se cativada por tanta propaganda fui para lá? O futuro desse lugar lindo pode ser uma caixinha de surpresas e espero voltar pra checar.
Tem uma outra Cartagena, mais Miami, mais Barra da Tijuca que só vi de longe. Centros históricos têm imã.
Depois eu volto pra falar do mar e das ilhas.